O prefeito pisou nas nossas flores e matou nosso cão
O comércio de Sao Paulo, que é responsável por quase 40% dos estabelecimentos e 20% dos empregos formais da cidade, está impedido de utilizar a publicidade para anunciar seus produtos e ofertas. Primeiro a Prefeitura impôs grandes restriçoes aos letreiros e indicativos das fachadas. Estabelecimentos com quase 100 metros de frente só podem utilizar 4 m2 de suas fachadas para colocar seu nome. Localizar lojas na cidade tornou-se um desafio. Se você nao é um cliente habitual, prepare-se para dar muitas voltas até encontrar a loja que está procurando. Imagine - na marginal Tietê, uma via expressa com mais de 60m de largura em alguns pontos, onde as lojas têm um afastamento de até 30 metros da via, você precisa achar um letreiro de 2m de comprimento.
O recurso de colocar uma placa indicativa - Shopping XXX, próxima saída - ou mesmo a clássica faixa 'Sob nova direçao' foi proibido pela mesma lei, que eliminou a publicidade exterior na cidade. Além de nao poderem indicar a localizaçao de seus negócios, ou usar o terreno de suas próprias lojas para se promoverem, os comerciantes também nao podem anunciar seus produtos, serviços e ofertas em espaços privados de outras pessoas. Depois, o prefeito interferiu nas vitrines. Os comerciantes estao proibidos de anunciar promoçoes, ofertas e descontos dentro de suas lojas que sejam visíveis das ruas. Nao podem botar fotos dos produtos que vendem em suas vitrines e fachadas. Se você vende perfumes, só pode botar aqueles frasquinhos mínimos. Se você vende piscinas, tem que botar a piscina na vitrine. Nada de fotos.
Os teatros, cinemas e outras atividades culturais, que têm uma programaçao que muda frequentemente, nao podem anunciar suas atraçoes nas fachadas ou vitrines. Com certeza o prefeito também acha que o setor cultural nao precisa disso. Agora o prefeito proibiu a distribuiçao de qualquer tipo de folhetos, panfletos e qualquer outro tipo de material que contenha publicidade. E ainda limitou a quantidade de publicidade que os jornais gratuitos de cidade podem ter. Nao importa se esta quantidade é suficiente para a sobrevivência destes jornais ou nao. Nunca uma prefeitura havia determinado ou limitado a quantidade de páginas publicitárias de um veículo de comunicaçao. Mas, afinal, o prefeito de Sao Paulo é um inovador.
Hoje em dia, se você abre uma loja em Sao Paulo, nao pode anunciar na sua fachada, na sua vitrine, na sua rua, no seu bairro. Só pode utilizar veículos com uma cobertura geográfica muito maior do que a sua necessidade, a um custo muitas vezes proibitivo. Se você já tem uma loja de rua, compete com tremenda desvantagem com as lojas de shoppings, que podem fazer o que quiserem com seus letreiros, vitrines, e ainda anunciar dentro das verdadeiras cidades que se tornaram os shoppings centers, que podem investir nos grandes veículos para atrair clientes.
Talvez a soluçao esteja nos velhos pregoeiros. Mas aí eles teriam que brigar com os milhares de ambulantes, com os caminhoes de pamonha, abacaxi e morango. E mesmo assim, nao adiantaria. O prefeito também proibiu isso. Em Sao Paulo, moça bonita nao paga mas também nao leva, feirante nao fala mas também nao vende, e comerciante não anuncia e também nao fatura.
Nunca é demais lembrar que estas proibiçoes nao se restringem ao comércio. Você nao pode ter plástico de sua universidade no carro, ou mesmo aquele adesivo da concessionária - R$ 10 mil de multa. Você nao pode ter nada na sua casa possa ser visto da rua e interpretado como publicidade - R$ 10 mil de multa. Tudo que era legal o prefeito proibiu. Mas tudo que já era ilegal continua. Faixas presas nos postes das esquinas, pais-de-santo prometendo a volta da mulher amada, pichaçoes nos muros, vendedores nos faróis e menores explorados nas ruas.
Mas tem mais - o prefeito também se auto-proclamou o responsável pelo meu, o seu , o nosso bem-estar estético - e os vereadores aprovaram. É sempre oportuno nos lembrarmos de Maiakovky, que já citei aqui, veja abaixo.
Na primeira noite, eles se aproximam
e colhem uma flor de nosso jardim.
E nao dizemos nada.
Na segunda noite, já nao se escondem,
pisam as flores, matam nosso cao.
E nao dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles,
entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua,
e, conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E porque nao dissemos nada,
já nao podemos dizer nada.
Fonte: BlueBus - Sergio Viriato.